Legalização do Aborto





Há dias que vejo em vários meios de comunicação sobre a questão da legalização do aborto. Algumas vezes porque era pauta de votação nas Assembleias de determinados países ou simplesmente era gente comum, no influencers – igual a mim – que resolveu escrever (e publicar) algo sobre – igual a mim neste exato momento. 


Todas as discussões, normalmente, giram em torno do “você é a favor ou contra” a legalização do aborto. 


Só que essa caralha é muito mais complicada do que isso!


A discussão, na verdade é sobre a descriminalização do aborto. Hoje, a discussão está no STF. A questão é que muitos juristas consideram que não cabe a eles votarem esse tipo de assunto e que o mesmo deveria ser enviado à Câmera dos Deputados. Tendo em vista o “nível” dos políticos que temos hoje, já se pode imaginar que vai continuar a mesma hipocrisia de sempre. 


Sinceramente, não consigo imaginar uma mulher sequer que seja a favor do aborto. Mas, consigo imaginar diversas situações em que as mulheres foram colocadas em que o final era sempre a pergunta: Fazer ou não o aborto? 


É muito mais complexo do que ter ou não autonomia sobre o que fazer com o próprio corpo e com a vida que está sendo gerada dentro de si. 


Você é mulher, pobre e sem ter tido bons estudos. Você teve um breve relacionamento com uma pessoa que não ficou na sua vida, nunca mais apareceu e tempos depois você descobre que está grávida. Não tem emprego e nem salário fixo. Não tem estrutura familiar, mas aos 20 anos, já tem mais dois filhos para criar. Bate aquele desespero. Você pode contar com os ouvidos de sua amiga que lhe aconselha a tirar o bebê. Você pensa durante um tempo e com os mínimos recursos disponíveis – vai ter que ficar devendo na clínica ainda, pagando parcelado – você procura uma clínica clandestina para fazer isso. Sem um mínimo de higiene, sem atendimento “humanizado”, sem perguntar nada além do “trouxe o dinheiro e os cheques pré datados?”, você se submete ao procedimento. Beleza. Você vai embora e poucas horas depois começa a sentir-se mal. Claramente algo não deu certo. Levam-te para a UPA que, depois de 5 horas esperando, te avisam que não tem médico disponível. Sua situação piorou bastante e te levam para um Hospital. Lá você aguarda 12 horas em uma sala de espera e de vez em quando um profissional chega perto de você para verificar o soro. Depois disto, na troca de plantão, quando o médico chega para te examinar, você está morta. E deixa dois filhos órfãos de pais vivos e mãe morta. Sabe Deus quem poderá criá-los. 


Ou...


Você consegue atendimento na UPA, verificam que é um aborto e comunicam à polícia. Você responde processo correndo o risco de ser presa e deixar dois filhos sabe Deus quem poderá criá-los. 


Ou...


Você é rica, teve um breve relacionamento e foi gerada uma criança. Você tem um futuro brilhante pela frente e seus pais desembolsam 15 mil reais para uma clínica particular e em três dias sua vida é a mesma de semana passada. 


Se, por sorte, você cai no primeiro caso, depois da sua morte, pessoas “de bem” comentarão: Bem feito... quem mandou matar um bebê!


Se, por sorte, você cai no segundo caso, o resto da sua vida ficarão te apontando como aquela que tem coragem de matar um bebê. 


Quem é que se importa com essa mulher? Todos que são contra o aborto... ATÉ O BEBÊ NASCER. Depois disso, é ela por conta própria. 


Precisa trabalhar em dois empregos diferentes, deixa os filhos em creches e depois de uma determinada idade, passam a ficar sozinhos em casa. Crescem um pouco mais e ganham autonomia para ficar na rua sem precisa de acompanhantes. 


Um dia, alguém chega para eles e diz: “Levem esses pacotinhos no alto do morro para mim, por favor. Dou R$ 50,00 para cada se vocês fizerem isso”. Eles fazem.


Começa assim. Depois a gente já sabe o que ouvir: BANDIDO BOM É BANDIDO MORTO.


O Governo, jogando essa discussão para a sociedade, gerando essa comoção social, quer tirar de si a responsabilidade sobre a vida destas mulheres pobres. O Governo não entra nas periferias para dar-lhes educação, saúde, prevenção e um pouco de dignidade. O Governo só entra nas periferias para matar seus filhos. 


Descriminalizar, seria assumir para si a responsabilidade de cuidar destas mulheres desde a decisão inicial até a decisão final, incluindo acompanhamento médico, psicológico, medicamentos e pós parto. Se não conseguem nem o básico, o urgente, quem dirá atuar na área de prevenção e promoção à saúde. 


O aborto existe. Mas, quem morre, quem entra para as estatísticas é sempre a mulher pobre. O que a sociedade deve ter é cuidado com isso para não fazer disto uma forma de criminalizar quem já nasceu condenado. 


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